Presidente da Funasa entre 28 de março de 2007 e 2 de abril de 2010, o deputado eleito Danilo Forte (PMDB-CE) diz ter reduzido a incidência de corrupção no órgão. Atribui a maioria dos malfeitos detectados em auditorias –cerca de R$ 500 milhões—a gestões anteriores.

Em entrevista ao blog, ele diz: “Não posso assegurar que acabou a corrupção na Funasa. Não sou maluco. Mas as torneiras, que eram escancaradas, foram fechadas numa proporção e numa velocidade muito grandes”. Abaixo, a entrevista:


- Entre as auditorias que detectaram desvios de meio bilhão de reais, quantas se referem à sua gestão? A grande maioria refere-se a períodos anteriores a 2007. O que não significa que não auditamos também convênios de 2008 e 2009. Em 2010, eu saí.
- Qual é a causa de tanto malfeito? A Funasa nasceu da junção de dois órgãos que não tinham nada a ver um com o outro: a Sucam, dos mata-mosquitos, e a Fundação FAE, que cuidava do abastecimento de água e esgoto em cidades pequenas do interior. A partir de 2002, passou a cuidar da saúde indígena. Como não tinha quadros e não havia concurso, terceirizou a tarefa a ONGs, por meio de convênios. A maioria das ONGs teve problemas na prestação de contas. Só na nossa gestão, afastamos 37 ONGs. Muitas passearam pela CPI ONGs do Senado. Uma parte não agiu de má-fe. Faltava pessoal habilitado a lidar com contas públicas. Outra parte fez muita picaretagem. Foi tudo de roldão. No ano passado, a Fusana perdeu a atribuição de cuidar das comunidades indígenas.
- E quanto aos convênios com Estados e municípios? Hoje, a Funasa opera em municípios com menos de 50 mil habitantes. Cuida basicamente de sanemaneto. Há 18 mil convênios. Para fiscalizá-los, cerca de 200 engenheiros. É humanamente impossível. É preciso fotalecer a estrutura técnica.
- Os malfeitos decorrem da ineficiência da Funasa ou dos desmandos estaduais e municipais? São problemas estruturais. Não temos estrutura para acompanhar o que se passa. Precisa contratar algo como 400 engenheiros. A Funasa trabalha com pequenos municípios, justamente os que têm mais dificuldades técnicas e administrativas. Eu presenciei obra executada e que não tinha a prestação de contas. Vi obra destinada a um município e construída em outro.
- Em 2008, o ministro José Gomes Temporão tachou a Funasa de corrupta e ineficaz. Referia-se à sua gestão? No mesmo dia em que fez essa declaração, ele esclareceu, em nota, que falava de administrações anteriores à minha. Pedi uma auditoria. Nunca tive contra mim pedido de restituição de um clips. Minhas contas foram todas aprovadas.
- O ministro queria substitui-lo? Ele queria colocar um cara do Rio de Janeiro no meu lugar, Oscar Berro. Não conseguiu. Tentou consertar a declaração. Era tarde. Eu disse que podia me substituir, mas tinha de demonstrar onde estava a corrupção.
- Quem o indicou para a presidência da Funasa? Quando o PMDB entrou no governo [Lula], Renan [Calheiros], Eunicio [Oliveira], Henrique [Eduardo Alves] e Michel Temer me chamaram para a Funasa. Disseram que tinha as minhas características. Eu disse: para mim, é um sonho.
- Qual é a sua formação? Sou advogado, mas trabalho com saneamento há 27 anos. Dirigi uma empresa de engenharia do Ceará, em São Paulo, entre 90 a 95. Chama-se Construtora Estrela.
- Por que a Funasa, tão encrencada, desperta a cobiça política?Por que tem um um papel político relevante. A demanda do país por saneamento é muito grande. Um quarto da população não tem abastecimento d’água. Apenas um terço tem esgoto. Pouco mais de 9% do lixo brasileiro é tratado.
- Tem-se a impressão de que, como noutros órgãos, os políticos querem a Funasa para destinar-lhe emendas orçamentárias e, em conluio com prefeitos, desviar verbas para campanhas ou para os próprios bolsos. Hoje, 90% dos investimentos da Funasa não vêm de emendas. Já foi assim. Mas, de 2007 pra cá, diminuiu o número de emendas na Funasa.
- Por quê? Exatamente porque aumentou o rigor fiscalizatório. Fiz rodízio de força tarefa. Pegava gente do Centro-Oeste e botava para fiscalizar no Nordeste, do Norte para fiscalizar no Sul. Houve tempo em que o cara pegava o dinheiro e não executava a obra. Hoje, é muito mais difícil. Baixei medidas para ter mais controle no acompanhamento das liberações.
- Quer dizer que os desvios via emenda não acontecem mais?Isso pode acontecer, mas não em escala diferente do que se passa em outros órgãos. Cabe à Funasa fiscalizar. E houve aumento da fiscalização. Posso lhe garantir que, hoje, esse tipo de coisa foi muito reduzida. Não posso assegurar que acabou a corrupção no Brasil ou na Funasa. Não sou maluco. Mas as torneiras, que eram escancaradas, foram fechadas numa proporção e numa velocidade muito grandes.
- Desde quando? A partir das portarias que fizemos em maio de 2007. Aumentamos o rigor fiscalizatório e começamos a demitir. Teve muita demissão na Funasa. Tem gente que responde a processo administrativo e a inquérito na PF até hoje.
- Por que, então, a Funasa está na berlinda? É o órgão mais aberto. Estava lá o PMDB, não outro partido. O PMDB é vitrine para muita coisa. Não quero culpar ninguém, mas até no banco do Vaticano teve problema de corrupção. Então, não podemos dizer que o problema está na instituição. Minha preocupação era de que fosse para lá um ministro que quisesse acabar com a Funasa. O [Alexandre] Padilha não quer. Ele já trabalhou na Funasa. O Temporão queria acabar com a Funasa.
- Parte dos malfeitos se refere ao período de Paulo Lustosa, que o antecedeu. As auditorias foram abertas na sua gestão? Na minha e na dele. Aquele negócio da TV Funasa é auditoria feita na gestão dele. A CGU avocou o processo e nós mandamos para lá.
- Inclui Lustosa, também do PMDB, no rol dos problemas? A gestão do Lustosa teve problemas. Não estou aqui julgando a responsabilidade dele. Mas teve problemas. Mandei todos os processos para o ministro julgar. Eu não queria julgar.
- Na sua gestão, recebeu algum pedido indecoroso? Muitos. Não vou citar pessoas, mas recebi muitos pedidos.
- Que tipo de pedido indecente passou por sua mesa? Rapaz, na política tem pedido de todo jeito.
- Deu curso a algum? Lógico que não atendi. Tanto que não tive nenhum problema. Minhas contas foram aprovadas pelos órgãos de controle.
- Os pedidos indecentes vieram do PMDB? Tudo quanto é partido. Em todo canto tem gente que presta e que não presta. Na política e em outras áreas. O segredo é conhecer o setor, ter noção de administração pública e não fazer bobagem.